Angola (leia-se, por enquanto, MPLA) simpatiza com a ideia de usar moedas alternativas ao dólar nas transacções de comércio exterior, defendida pelo actual Governo brasileiro de Lula da Silva (um herói para muitos angolanos que até não são do MPLA), disse a ministra das Finanças angolana, Vera Daves, em declarações à Lusa.
Assim, à margem da cimeira de ministros de Finanças e governadores de Bancos Centrais do G20, na cidade brasileira de São Paulo, questionada sobre a defesa que o Presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, faz da adopção de outras moedas como referência para as transacções internacionais, Vera Daves afirmou que Angola “simpatiza com a ideia”. A Rússia de Vladimir Putin também simpatiza, mas essa é outra história.
“Devemos explorar sim essas avenidas para diversificar. Da mesma forma como se diversifica a economia, também se deve diversificar o portfólio de moedas para ter resiliência. Quando há um choque de taxa de juros, quando há um choque de taxa de câmbio numa moeda, na relação com uma moeda, temos a outra para fazer contrapeso”, justificou a ministra angolana.
Sobre a escassez de divisas no mercado interno angolano, a ministra das Finanças considerou que a solução estrutural para o problema é o crescimento e diversificação das fontes de renda.
“Angola basicamente exporta petróleo e as divisas que recebe do petróleo, usa ou para pagar dívida externa, como referi, ou para pagar algumas despesas que tenha também em moedas externas – contratos, prestação de serviço, bens, o que for- em dólares”, destacou.
“Para isso ser menos asfixiante, porque naturalmente vamos ter que continuar a fazer investimentos em infra-estruturas e vamos continuar a ter esse conjunto de despesas, temos que encontrar outros bens e serviços de exportação que nos dêem acesso a dólares, para além do petróleo. E ainda hoje abordei esse tema com o ministro das Finanças do Brasil, Fernando Haddad. Conversámos rapidamente e pedimos a ajuda dele”, acrescentou.
Vera Daves revelou que Angola levou aos debates dos ministros das Finanças do G20 o interesse em atrair empresários do sector agrário e pecuária porque Angola tem terras produtivas e água, além de contar com vizinhos como a República Democrática do Congo que, segundo ela, tem “muito apetite para comprar produtos alimentares”.
“O agronegócio é algo a que queremos prestar atenção, no qual temos colocado muita energia (…) Angola produz localmente, mas para consumo interno, e gostaria de atrair empresários e fazendeiros com conhecimento e capacidade para levar o país ao próximo nível que é exportar”, disse.
“Gostaríamos que as autoridades brasileiras estudassem a possibilidade de financiar investidores privados interessados em produzir em Angola para exportar para outros mercados na região”, completou.
Diversificar a economia, insistiu Vera Daves, ajudaria Angola a ter divisas de outras fontes que não são só o petróleo. Embora a tese da diversificação económica seja tão velhinha que ameaça morrer a qualquer momento, o MPLA parece ter encontrado em Lula da Silva o segredo da vida eterna.
“Se a produção de petróleo cai, se o preço do petróleo cai, temos um contrapeso em outras fontes. O ministro Fernando Haddad disse que tomava boa nota e, de resto, quando o presidente Lula da Silva visitou Angola (…) esse foi um dos temas que foi levantado”, concluiu.
O Brasil, que assumiu a presidência do G20 a 1 de Dezembro de 2023, foi o anfitrião de uma cimeira em 28 e 29 de Fevereiro, que reuniu os máximos responsáveis pelas pastas de Finanças das 20 maiores economias do mundo, incluindo também a União Europeia e a União Africana.
A reunião, que contou também com a presença dos governadores dos Bancos Centrais decorreu num contexto global volátil, marcado por novas tensões geopolíticas e em pleno debate sobre o ritmo da flexibilização monetária, na sequência da escalada inflacionista pós-pandemia.
As prioridades da presidência brasileira para o seu mandato à frente do G20 são o combate à fome, à pobreza e à desigualdade, o desenvolvimento sustentável e a reforma da governança global.
O Brasil convidou Portugal, Angola, Egipto, Emirados Árabes Unidos, Espanha, Nigéria, Noruega e Singapura para observadores do G20 em 2024.
A economia brasileira cresceu 2,9% em 2023 face a 2022, impulsionada sobretudo pela agro-pecuária, mas também pela indústria e serviços, revelam dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
O crescimento em 2023, menor que o do ano anterior (3%), foi sustentado principalmente pela força do sector agro-pecuário (cresceu 15,1 %), enquanto a indústria cresceu 1,6% e os serviços 2,4%.
No quarto trimestre, o Produto Interno Bruto (PIB), que é a soma dos bens e serviços finais produzidos no Brasil, estagnou em relação ao terceiro trimestre, o que constitui o pior valor trimestral em 2023, segundo dados do IBGE.
No conjunto do ano, o primeiro de governo do Presidente Lula da Silva, e que encadeou três anos seguidos de expansão, a economia brasileira, a maior da América Latina, registou um PIB “per capita” de 50.193,72 reais (9.352 euros), um aumento de 2,2 % em relação a 2022.
Do ponto de vista da procura, o crescimento do PIB foi suportado pelo consumo interno (3,1 %), valor apoiado pelo aumento dos salários, pelo arrefecimento da inflação e pelos programas governamentais de transferência de rendimentos, segundo o órgão responsável pelas estatísticas do Governo brasileiro.
Já os gastos públicos avançaram 1,7% e a formação bruta de capital fixo caiu 3%, com forte queda no investimento em máquinas e equipamentos (-9,4%).
A taxa de investimento foi de 16,5% do PIB, inferior à de 2022 (17,8%), sendo que este indicador representa a parcela de investimentos no total da produção de bens e serviços finais produzidos no país. Seguindo o mesmo sentido, a taxa de poupança foi de 15,4% do PIB, em 2023, valor inferior ao de 2022 (15,8%).
No sector externo, a economia brasileira registou crescimento nas exportações de bens e serviços (9,1%) enquanto as importações diminuíram (1,2%) comparativamente com o ano anterior. Embora o resultado do PIB em 2023 esteja em linha com as projecções mais recentes, a taxa ficou acima do que os analistas esperavam no início do ano.
Para 2024, o Fundo Monetário Internacional (FMI) e economistas do mercado financeiro projectam um crescimento de entre 1,5% e 1,7% para a economia brasileira.
Em Agosto de 203, o Presidente brasileiro deu “nota 10” à sua visita de Estado a Angola, manifestando-se disponível a partilhar experiência do seu país sobre o combate à fome.
“Acho que essa foi a melhor visita que eu fiz a Angola, melhor visita que fiz, quero agradecer inclusive o carinho que o Presidente João Lourenço teve com a minha delegação, tratamento perfeito e só tenho de agradecer, vou dar nota 10 para esta visita e na próxima vez vou dar 10,5”, respondeu Lula da Silva.
Em declarações aos jornalistas, no balanço da sua visita de dois dias a Angola, o chefe de Estado brasileiro disse que a ocasião serviu para sinalizar o regresso do Brasil a Angola e o reforço das relações bilaterais que duram há quase cinquenta anos.
Fazendo o balanço da visita a Angola no Instituto Guimarães Rosa de Luanda, onde inaugurou a Galeria Ovídio de Andrade Melo, o Presidente brasileiro manifestou igualmente abertura do seu país em partilhar com Angola experiências sobre o programa “Fome Zero”.
“Acho que Angola tem todas as condições, estou a ter informações sobre o canal de água em construção no Cunene, acho extremamente importante, e nós temos interesse em trocar com Angola todas as experiências das nossas políticas de inclusão social, levando em conta a realidade de cada país”, disse.
Segundo Lula da Silva, a fome é combatida “se os países compreenderem que os povos pobres têm de entrar no Orçamento da nação”.
“Não adianta você começar a fazer o orçamento com tanto para a diplomacia, defesa, saúde, educação, tudo é importante, mas tem que ter a parte do povo pobre e foi isso que nós conseguimos fazer e deu certo no Brasil”, notou.
“Se a gente levar condições para o pequeno produtor produzir, a gente vai acabar com a fome”, rematou o Presidente do Brasil.
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